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24 de abril de 2022

TPK moral


O TPK pode ser acidental. O narrador superestimou os jogadores, ou uma série infeliz de rolagem de dados pode causar o TPK. Derrota não significa um TPK, ao menos para jogadores sóbrios que ao sentir que estavam enrascado fujam, ou se a missão era impedir um evento - o assassinato de alguém que acaba morto ou a "liberação de um mal ancestral nas terras do rei" - não conseguiram impedir o evento. Há aventura e histórias nas consequências disto. 

No TPK, todo mundo morre.


Há certa controvérsia se aquele Halfling bardo que, ao ver 90% do time morrendo, lança invisibilidade e corre sem ser notado - ou pior: não é digno de uma perseguição do mau que vitimou sua equipe. Mas mesmo se considerar que um novo grupo será feito no mesmo mundo em que aqueles heróis morreram, o mais provável é que a campanha morreu. O Halfling pode até sobreviver na lenda, e até integrar outros grupos, mas a história é outra. A partida findou-se. Até comentarão no futuro que "essa vila foi salva por um grupo que pereceu numa caverna", mas será um floreio, não a história.

Aqueles heróis vieram, viveram, e morreram. Esse é o TPK.

O TPK moral é mais vergonhoso.

Primeiro, porque é um "Jogo de força" com o Mestre de Jogos... Mas é seu personagem limitado, seguindo regras e com conhecimento limitado, contra um cara onisciente que controla deuses e que pode decidir que as regras não se aplicam. Se o Mestre quiser, você faz seu ranger elfo nível 1 com mais 1d4 amigos no mesmo nível, e se deparam com 12 dragões vermelhos anciões. O Mestre tem poder para fazer isso. A consequência na terceira vez (caso o grupo seja persistente) que o grupo fizer personagens de nível 1 e encontrarem as 12 bestas é eventualmente irem pro bar e não retornarem à mesa de jogos. Novamente: Um desfecho... Pro mau, mas o suplício acabou.

Mas para o "Mestre safo", uma boa partida é aquela que ele destrói o grupo com o mínimo de poder possível. Se ao invés de 12 dragões vermelho forem 12 goblins, mas todos possuem uma classe de NPC homebrew e "adivinhou" as fraquezas de seus personagens como se um ser onisciente tivesse reunido aqueles humanóides? vai "parecer" uma luta justa, mas... Podiam ser 12 dragões da mesma forma.

Mas se é chato para o cara que morreu para os goblins surpreendentemente imunes ao Hunter's Mark do Ranger elfo, que escolheram como lugar de combate um terreno que neutraliza as magias dos demais membros do grupo... Imagine para o Halfling? Tudo o que resta é correr. 

Um TPK normal, o grupo todo morre. Se concordam que a consequência era aquela, suas escolhas os levaram aquele desfecho, eles aceitam e começam de novo... Ou mesmo encerrram a campanha e partem para outra. Não há compromisso... Mas e o Halfling? Ele ainda está vivo, e o mestre tem planos para ele, e os goblins que na verdade eram dragões vermelhos anciões disfarçados. Os demais se sentem na "obrigação" de acompanhar. Fazem novos personagens, e se juntam ao Halfling. Eles fogem das terras dos Goblins para enfrentar uns oito kobolds que estavam roubando galinhas nos arredores... mas esses Kobolds eram os CHEFES dos Goblins... E então, Grupo morto, Halfling bardo foge. Kobolds riem. Repete.

Falo isso porque já estive numa CAMPANHA que foi do nível 2 ao 8º nesse sentido, era o 3.0 (chegou a entrar um pouco no então-novo 3.5 do D&D). O mestre era mais "sutil" no caso. Começamos com uma ameaça de um general orc que uniu o nosso grupo para encontra-lo e dar um sacode. O general, sozinho, matou 2 dos jogadores em luta, humilhou os demais a ponto de nos rendemos. Ele, por ser "piedoso", disse que nos pouparia se fôssemos dar cabo de um outro desordeiro que ele não gostava.

Evoluímos com os poucos XPs que uma aventura com derrota permitia; recrutamos novos heróis (novos personagens dos jogadores que perderam a vida) e fomos nesse segundo desagrado... Ele era mais forte que o general orc.

Repetiu-se. matou 1d3 dos nosso, nos humilhou e nos fez de reféns, e mandou atrás de um mendigo... Era mais forte ainda... e repete-se.

Eu sei que era um guerreiro Kaliman full do oitavo nível e nunca achei ninguém mais fraco que eu. Eu tinha inclusive "na história" desistido de ser aventureiro após mais uma derrota humilhante e buscava uma fazenda para pedir emprego quando descobri que o último "Mau" que nos derrotou tinha me amaldiçoado e eu precisava da cura indo atraz de um cara mais forte que o anterior. Suspeito isso, não?

Tudo ficou claro quando chegamos no vilão da vez quando eu galguei o 8º nível. Eram três Green Hags com vastos poderes maiores que o das que constavam no Livro dos Monstros... Mas algo estranho aconteceu. Estávamos GANHANDO!

Não lembro se foi sorte nos dados, ou alguma armadilha que deveria nos debilitar que não deu certo... O fato era que íamos ganhar das bruxas....

... Então, um cara chegou nos momentos antes da primeira Hag cair. Ele era um druida que se transformou numa Vorme Púrpura gigante só para nos intimidar.

O jogador que era druida (eu não conhecia as regras à época) declarou: "Esse cara é meu herói! porque druidas não podem virar esse tipo de monstro (Era 3ª edição)".

Percebi naquele momento (demorei para realizar, admito) que era uma sequência de TPKs morais. Ninguém abandonava a mesa porque ao invés de matar todos - e ele podia - o "vilão" nos mandava em outra aventura. Mesmo quando eu quiz "me aposentar" algo me prendeu à maldição de continuar indo à luta mesmo sendo incapaz de ser desafio aos monstros. 

Já era óbvio mesmo para meu eu Noob que o "npc fodão" aparece antes da hora (se as bruxas ganhassem iria certamente nos mandar atrás dele). Mas nessa ele mandou o grupo roubar "a armadura Negra de um deus do mal" ou coisa assim. Não me lembro. Só sei que o Deus estaria morto e a gente deveria abrir a porta, pegar suas ceroulas negras, e voltar. Nada mais fácil. A armadura não traria o Deus Negro à vida para nós lutarmos, apanharmos e sermos forçados a ir atraz de outrem, não é?

Meu clérigo (sim, o meu Guerreiro de 8 nível foi o que morreu desta vez) se juntou ao grupo já com essa idéia em mente. Fomos à masmorra da vez e, antes de abrir a porta onde pegaríamos as cuecas de ferro negras, eu pedi ao grupo que parasse.

"Eu vou lançar a magia Augúrio. Se os >>Deuses do Bem<< concordarem com nosso rumo de ação, Iremos em frente, sem risco de libertarmos o tal Deus Cavaleiro Negro de Toda a Maldade que era senhor dessa armadura. Caso contrário, voltamos daqui".

É uma magia de "Sim" ou "Não". Nada mais claro possível. Se a resposta fosse nebulosa, ficou claro que iríamos voltar. Se os Deuses dissessem "Vá em frente" e aparecesse o Deus Negro do Mau Maligno para nos matar (provavelmente meu clérigo, que leu entre as linhas iria rodar de novo) e nos mandar enfrentar um Super Duper Deus do Mau, tería como consolação exposto o verdadeiro vilão: O Mestre do TPK moral.

Infelizmente ele exigiu que gastássemos 1 minuto para a magia IRL (?!?). Nesse ínterim, ele trocou anotações com o novo jogador (literalmente: tinha entrado na mesa naquela sessão, não tinha passado pelos 6 níveis de humilhação que meu falecido guerreiro). Então, do nada, o novato sai correndo e decide abrir a porta antes do fim do ritual do Augúrio que estava quase na metade de seu curtíssimo tempo de espera. Eu lanço Muralha de Fogo entre ele e a porta, ele ATRAVESSA AS CHAMAS, aceitando todo o dano e tudo o mais, para abrir aquela porta porque não pode esperar 37 segundos! Nunca soube o que estava naquele papel que o narrador passou para ele, mas não é difícil imaginar...

Claro, o Deus Cavaleiro Negro do Mau maligno, que o mega-blaster-druida-corme-púrpura temia, estava lá e voltou à vida porque o novato abriu a porta. O combate foi na sessão seguinte, mas eu não voltei à mesa para o desfecho, mesmo suspeitando de como se deu e qual seria a próxima. 

Hoje eu considero Fato: O grupo todo MORREU naquele general orc no segundo nível. O que tomamos por piedade era uma etapa de um ritual que nos prendeu em um círculo de derrotas e humilhações. Se toda semana meu personagem morresse, eu teria desistido há muito tempo, mas fiquei até o 8º nível (tive "sorte" porque a partir de certo nível todo vilão do mestre tinha aura de pânico, então meu guerreiro fracassava com sua Vontade 3 e demorou para ser "o morto da vez"). Olho para aquele personagem e realizo que não fiz nada. Ele não salvou ninguém. Viveu e morreu sem fazer a diferença. Ele não era um Kaliban com 20 de força com corrente de cravos e trespassar aprimorado que pelos números poderia cuidar sozinho de uma aldeia de vilões... era um chorão que ou estava com medo num canto ou estava sendo humilhado por um NPC 12 vezes mais forte que tinha uma magia especial que neutralizava justamente aquilo que ele sabia fazer. E quando percebeu que era um bosta e quiz virar fazendeiro, contraiu uma doença que o fez voltar ao círculo de Caça o Boss, apanha do Boss, pede clemência ao Boss, Mandam ir atrás de um Boss mais forte ainda. Imagino que o Mestre estava com orgulho de como seus NPCs eram tão fantásticos que nós éramos incapazes de os desafiar. Talvez exceto as bruxas, mas como parte do secto do Mega-druida-vorme-púrpura, era uma isca para dar uma centelha de confiança aos jogadores antes de esmagar-nos. Era um tempero no prato de fodolância. 

Meu guerreiro e seus companheiros sofreram um TPK moral. Renasciam cada qual em sua vez em um novo amaldiçoado numa história que nunca teria um fim. Se você gosta da parte "roleplay", não vai haver felicidade para você, pois jamais fará algo digno de nota, e mesmo a desistência é proibida sob pena de maldições e doenças cuja cura é se manter no círculo. Se você gosta da parte "game", não vai haver felicidade para você, pois a vitória é uma ilusão. Nada que estiver em seu caminho estará no limite de suas capacidades, e se estiver, um Vorme Púrpura vai quebrar seu encanto.

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ADENDO - a caverna


É um exemplo que me marcou na época. Quando o Clérigo substituiu meu guerreiro morto pelo Druida Vorme Púrpura se juntou ao grupo, íamos atravessar uma Caverna chamada "Caverna do Fogo". Era o caminho para chegar à salão da armadura do "Deus Cavaleiro Negro do Mau". COmo era literalmente meu primeiro personagem conjurador, pedi ajuda para escolher as magias. Quando descobri que o Clérigo poderia escolher as magias que quizesse, fiquei feliz. Achei que ao emnos teria as ferramentas ideais para as circusntâncias.

Confirmei que a "Caverna de Fogo Infernal" que iríamos era uma passagem escaldante com ameaças de fogo e de calor, no coração de um deserto. Com esse aspécto temático, preparei magias de defesa e resistência a fogo, ataques de frio e gelo, se tinha qualquer forma de ajudar contra chamas calor e queimaduura, eu pegava.

Ao chegarmos,  realmente tinha uma caverna com uma porta de fogo. Outro jogador usou a "chave": Uma Caixa dos invernos.

Um vento frio apagou o fogo. 

A caverna do fogo virou uma caverna de gelo. Como ninguém agasalhou, tínhamos que resistir ao frio constante, escorregões. Até mesmo um VORME DO GELO apareceu na aventura! Até entendo mudar o clima da dungeon, mas a ponto de brotar monstros de gelo numa outrora caverna de fogo?!?

Se antes meu guerreiro era inútil ao grupo pela aura de pânico que todos os vilões tinham até então, mesmo com meu conhecimento prévio eu juntei magias e proteções que se tornaram inúteis para a partida inteira. Ainda não sei por que achei que o Augúrio iria funcionar, pensando melhor hoje.

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